quarta-feira, 25 de março de 2009

A escolha e o chamado de Abraão


A história de Israel tem seu início em Gênesis 12:1-3 quando Deus escolhe e chama Abraão com a finalidade de fazer, a partir dele, uma nova e grande nação. Embora esta promessa tenha colocado Abraão e seus descendentes num papel de grande visibilidade e importância na história da salvação, uma análise mais cuidadosa do evento que envolve sua eleição e chamado pode nos oferecer uma visão mais precisa acerca dos propósitos de Deus para com esta nova e grande nação que viria a surgir.



Primeiramente, a eleição e o chamado de Abraão são inteiramente frutos da ação graciosa de Deus. Como Hedlund observa, sendo Abraão um arameu de ascendência pagã (Gênesis 11:26-29) e originário de uma família idólatra (Josué 24:2), ele não poderia ter qualquer mérito na escolha de Deus.[1] Abraão e seus descendentes deveriam lembrar-se constantemente que sua eleição e chamado não se baseavam em seus próprios méritos, mas na iniciativa de Deus em amá-los e chamá-los dentre as nações (Deuteronômio 7:6-8). Como Berkouwer afirma, “esta imerecida eleição excluía desde o princípio toda autoconfiança e toda pretensão dela derivada.”[2]

[1] Roger E. Hedlund, The Mission of the Church in the World (Grand Rapids: Baker Book House, 1991), 37
[2] G. C. Berkouwer, Studies in Dogmatics: The Church (Grand Rapids: Eerdmans, 1976), 403



Em segundo lugar, uma vez que a eleição e o chamado de Abraão apontam para a graça de Deus, esta eleição e este chamado são para ser entendidos não como um mero privilégio, mas como uma responsabilidade para com as nações da terra.[1] A eleição é um chamado para o serviço e envolve o dever de testemunhar entre as nações.[2] Abraão e sua descendência foram comissionados para ser canal pelo qual outras nações seriam abençoadas. O mesmo Deus que abençoa Abraão também o comissiona para ser o instrumento de sua benção a todas as famílias da terra. Portanto, a eleição e o chamado não poderiam ser entendidos por Abraão e sua descendência como benefícios para seu próprio conforto e satisfação, mas para o serviço às nações junto a missão de Deus na história humana. Enfatizando isso, Newbigin escreve:

"Aqueles que são escolhidos para serem portadores das bênçãos, são escolhidos em favor de todos… Novamente deve ser dito que eleição é para responsabilidade e não para privilégio… A Bíblia está cheia de referências ao propósito de Deus em abençoar todas as nações… há um processo de seleção: poucos são escolhidos para serem portadores do seu propósito; eles são escolhidos, não para benefício próprio, mas em favor de todos." [3]

Assim, podemos afirmar que a eleição e o chamado do povo de Deus no Velho Testamento têm sua base no propósito intencional, universal e missionário de Deus na história da humanidade.[4] Apesar de que o modo através do qual Israel viria a ser usado é desenvolvido ao longo da história da salvação, em Gênesis 12 podemos encontrar em forma embrionária a natureza e propósito do povo de Deus no mundo.

[1] Blauw, 23, e Hedlund, 37
[2] Verkuyl, 94
[3] Lesslie Newbigin, The Open Secret (Grand Rapids: Eerdmans, 1995), 32-34. Ênfase do autor.
[4] Por “propósito universal de Deus” não quero dizer “salvação universal” sem a necessária resposta e compromisso de fé. Refiro-me aqui à intenção de Deus em levar a mensagem de reconciliação para todas as nações da terra.


Em terceiro lugar, a eleição e o chamado de Abraão são manifestações da graça de Deus para com um povo, mas visando todos os povos da terra e não somente aos povos vizinhos de Israel. O contexto no qual Gênesis 12 está inserido, nos oferece um significado amplo e universal para o ato de Deus. Como Carriker demonstra, em Gênesis 12 encontramos a resposta de Deus para a dispersão humana (Gênesis 11:1-9), a qual é também o clímax da história universal (Gênesis 1-11).[1] Assim, podemos concordar com Blauw ao afirmar que toda a história de Israel nada mais é do que a continuação do interesse de Deus para com as nações, e portanto, a história de Israel pode ser entendida somente a partir do problema não resolvido na relação entre Deus e todas as nações.[2]

Desta forma, ao eleger e chamar Abraão, Deus não está lidando apenas com um homem ou um povo, mas com toda a criação e com toda humanidade. Através da escolha de Abraão, Deus está traçando o caminho para redimir todas as nações da terra. Como Verkuyl afirma que através de Israel, Deus prepara o caminho para alcançar Seus objetivos de abraçar o mundo. Escolhendo Israel, como um segmento de toda a humanidade, Deus nunca tira seus olhos das outras nações; Israel é a minoria chamada para servir à maioria.[3]

[1] Timóteo Carriker, Missão Integral (São Paulo: Editora Sepal, 1992), 45
[2] Blauw, 19. O Deus que escolheu Abraão em Gênesis 12 é o mesmo único e poderoso Deus que no princípio criou os céus e a terra (Gênesis 1,2), que criou o homem à sua própria imagem como o centro de toda a criação (Gênesis 1,2), que prometeu, depois da queda humana, que um descendente da mulher esmagaria a cabeça da serpente (Gênesis 3), que enviou o dilúvio sobre a terra, que estabeleceu uma aliança com Noé e seus descendentes (Gênesis 5-10) e que dispersou as nações em Babel (Gênesis 11). De acordo com Blauw, a ligação entre o que é conhecido por Urgeschichte (Gênesis 1-11) e a origem de Israel (Gênesis 12) é convincentemente demonstrada por Gerhard Von Rad em Old Testament Theology Vol I (New York: Harper & Brothers, 1962), 136-175.
[3] J. Verkuyl, Contemporary Missiology: An Introduction (Grand Rapids: Eerdmans, 1978), 91-92

domingo, 22 de março de 2009

Conhecâ-lo é tudo


A pergunta do jovem rico: “O que farei para ter a vida eterna?” é a pergunta que pulsa no coração do ser humano. O homem foi criado para viver. O que ele mais quer é viver. Pode a vida ser a mais miserável das vidas, mas quando chega a hora da morte o homem se agarra com desespero à vida. A morte é uma intrusa na experiência humana e por isso não é aceita. O maior desejo do homem é viver. Para ter vida ele é capaz de fazer qualquer coisa, pagar qualquer preço, realizar qualquer sacrifício. “O que farei para ter a vida eterna?” É o grito desesperado do coração humano.


E a resposta de Cristo é simples: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (João 17.3). Você vê? O segredo da vida eterna não consiste apenas no conhecimento de um corpo de doutrinas ou na aceitação de uma determinada Igreja. O segredo é o conhecimento de uma pessoa: a pessoa maravilhosa de Jesus Cristo. O verdadeiro cristianismo é um relacionamento de duas pessoas: o ser humano e Cristo. O que mais importa em nossa experiência espiritual não é o QUE cremos, mas em QUEM cremos.

A razão para acreditar que o verdadeiro cristianismo é o relacionamento pessoal entre Cristo e o homem é que a justiça e o pecado só podem existir entre pessoas. Uma estrela, um gato, uma mesa ou uma pedra não podem pecar ou ser justos. Só as pessoas pecam. Por isto o pecado, mais do que a violação da lei, é a interrupção do relacionamento de amor entre Cristo e o ser humano. Esta é a verdadeira desgraça do pecado. Quando peco, estou ferindo meu Jesus, ferindo a mim mesmo e trazendo separação entre ambos.

A maldade do pecado do Éden está melhor revelada no fato de Adão se esconder de Deus do que simplesmente no comer do fruto proibido. Isto é o pior do pecado. O ser humano que antes corria e se jogava nos braços do Pai, depois de pecar, escondeu-se de medo e causou profundo sofrimento ao coração de Deus. Estava o Pai triste porque alguém quebrou a lei? Ou estava sofrendo por causa da separação?

Isto nos leva à conclusão de que a salvação, a vida eterna nada mais é do que uma reconciliação ou um novo relacionamento pessoal com Cristo. Somos salvos, quando cremos em Jesus, quando amamos a pessoa de Jesus, não apenas seu nome, nem suas doutrinas, nem apenas sua Igreja.

Não podemos, porém, amar uma pessoa sem conhecê-la, por isso o inimigo fará todo o possível para nos distanciar mais e mais de Deus, ou então para aproximar-nos de Deus com uma idéia errada do Pai. O inimigo não quer que conheçamos a Jesus ou, na pior das hipóteses, quer que o conheçamos com a imagem de um Deus tirano, ditador, preocupado mais com suas normas do que com seus filhos. Essa imagem de Deus não inspira amor, inspira medo; não inspira desejo de servi-lo, gera a obrigação de servi-lo. A conseqüência é uma religião triste, um cristianismo formal. É o medo do castigo que nos leva a obedecer. O inimigo fica feliz com isso. Conseguiu o que queria. Se não conseguiu levar-nos para longe do Pai, pelo menos nos trouxe para perto dele pelos motivos errados.

Conhecer Jesus é tudo, sabe por quê? Porque conhecê-lo como na realidade ele é, conhecer o que ele fez por nós na cruz do Calvário, saber quanto ele nos amou apesar de nossas atitudes ou de nossa rebeldia, não nos dá outra alternativa a não ser de apaixonarmos por ele, amá-lo com todas as forças do nosso ser. E porque o amamos, desejaremos ser como ele é, viver como ele quer, ver sempre um sorriso estampado em seu rosto. Conseqüentemente, deixaremos de fazer tudo aquilo que o deixa infeliz. Conhecer Jesus é tudo porque a salvação não provém do esforço humano, ela é um presente de Deus e esse presente é a pessoa de Jesus Cristo. Conhecer Jesus é ter a salvação e, portanto, a vida eterna.


Quando João fala de “conhecer Jesus” não está falando apenas de um conhecimento teórico. João vivia numa época em que predominava o pensamento helenístico. Os gregos endeusavam o conhecimento teórico. Para um grego dizer que conhecia uma flor ele ia à biblioteca, estudava tudo o que as enciclopédias e livros falavam sobre a flor, e dizia: “Conheço a flor”. João não. Para ele dizer que conhecia a flor, além de ler o que os livros diziam, ele ia ao campo, tocava a flor, contemplava a beleza da flor, cheirava a flor, sentia nas mãos a textura de suas pétalas e então dizia: “Conheço a flor”.

Conhecer, para os gregos que viviam no tempo de João, era acumular conhecimento teórico. Conhecer, para o discípulo amado, era uma experiência de vida. O conhecimento teórico pode ajudar enquanto as coisas andam bem. O conhecimento experimental é, por sua vez, a única solução para os momentos de crise.

A maioria dos discípulos limitavam-se apenas a ouvir as palavras de Jesus. João ia além. Ficava perto do Mestre e reclinava a cabeça no coração de Jesus. A diferença revelou-se na crise. Quando os judeus prenderam a Jesus e o levaram ao Calvário, todo mundo o abandonou. O único que ficou perto da cruz foi aquele que não se contentou em ouvir Jesus, nem apenas saber acerca dele, mas que procurou um conhecimento experimental.

“E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste”. Simples como uma flor, como uma criança, como um sorriso, como todas as coisas de Deus. Somos nós que às vezes complicamos as coisas, as tornamos difíceis e roubamos a beleza natural.


Nunca poderei esquecer a emoção que me produziu a leitura de um incidente ocorrido nos Estados Unidos. Trinta e seis crianças estavam presas numa sala de aula no primeiro andar de uma escola em chamas. As escadas estavam tomadas pelas chamas e fumaça. As saídas de emergência emperradas. Não havia outra saída. Trinta e seis rostinhos de crianças assustadas estavam colados nos vidros das janelas. Os bombeiros ainda não haviam chegado. Não havia policiais por perto. O resgate parecia impossível.

Marcos vivia dois quarteirões abaixo. Quando viu o fogo, ele correu para a escola. Sua missão, naquela manhã, não era rotineira como a de um policial ou um bombeiro. Ele foi impulsionado por outro sentimento. Ao chegar ao lugar, ele gritou para os garotos quebrarem o vidro. Os pedaços de vidro caíram pelo chão.

Marcos era um homem alto, musculoso e forte. Todo mundo podia ver o brilho de confiança em seus olhos, a segurança de seus braços e o amor em sua voz quando gritou aos garotos: “Pulem para cá, que eu os segurarei”. Uma a uma, as crianças começaram a pular. Os poderosos braços de Marcos os seguravam e os depositavam no chão. Finalmente todos estavam salvos. Quero dizer, todos menos um. O pequeno Mike olhava para baixo e dava um passo para trás com medo. Marcos gritou, suplicou, pediu, ordenou: “Pule Mike, nada vai acontecer, eu vou segurar você”. A professora de Mike gritou: “Pule Mike, pule”. Seus coleguinhas gritavam: “Pule Mike, pule. Nós conseguimos você também vai conseguir”. O garoto ficou ali gelado de medo. No dia seguinte encontraram seu corpo carbonizado. O corpo de Mike, filho de Marcos que salvara 35 crianças no dia anterior.

O que foi que aconteceu? O que saiu errado? Não sabemos. Nunca ninguém saberá, muito menos Marcos. Ele era um pai amoroso. Tinha dado para o filho tudo o que o garoto precisava, tinha brincado com ele, tinha lhe dado carinho, dividido com ele parte de seu próprio coração. No momento em que a vida de Mike estava em perigo, entre a esperança e o desastre, entre a vitória e a tragédia, entre a vida e a morte, Marcos estava ali com os braços estendidos, pedindo, suplicando, implorando, chorando para que o filho pulasse não ao frio e duro concreto, mas para seus braços seguros, confortáveis e carinhosos, braços de um pai que ama. Mas alguma coisa não deu certo, Mike morreu.

Seremos diferentes? Correremos com alegria aos braços do Pai maravilhoso e andaremos com ele num relacionamento de amor mútuo, ou ficaremos gelados como o pequeno Mike, com medo, porque as chamas da desconfiança nos levam a ver a imagem distorcida de um Deus tirano, cruel e justiceiro? Encerro esta mensagem orando para que Deus toque em seu coração e alma. Que você consiga vencer seu próprio medo e se lançar nos braços seguros de Jesus. Ele continua com os braços estendidos falando com você: Pule em meus braços e eu te segurarei. Por muitos anos tive medo de lançar-me em seus braços, até o dia em que o conheci. Este Jesus, que eu não conhecia, deu-me a oportunidade de relacionar-me de maneira significativa e real com ele. E você? Que Deus o abençoe.

quarta-feira, 18 de março de 2009

Introdução

Alguns autores distinguem o termo “missão” e “missões”. Enquanto o primeiro refere-se à atividade do Pai, do Filho e do Espírito Santo no mundo (Missio Dei), o segundo se refere ao engajamento da igreja nesta “missão” (Missio Ecclesiea) Desta forma, “missão” não tem como sua fonte a “igreja”, mas o Deus trino.

O documento final da conferência de Willingen (1952) já afirma: “O movimento missionário do qual somos parte, tem sua própria fonte no Deus trino.” Mas segundo Verkuyl, a igreja demonstra estar engajada com a missão de Deus na história da humanidade quando, em comunhão com Cristo e direcionada pelo Espírito Santo, demonstra os frutos do amor a Deus e aos homens.[1]

Mas existe possibilidade da Igreja não estar engajada com a missão de Deus no mundo? Segundo o documento final da conferência de Cidade do México “não há participação em Cristo sem participação em sua missão”.[2] Logo, igreja sem missão não é definitivamente Igreja.

[1] J. Verkuyl, Contemporary Missiology: An Introduction (Grand Rapids: Eerdmans, 1978) 4
[2] Op.cit., 4

‘Missão’ descreve tudo o que a igreja é enviada ao mundo para fazer. ‘Missão’ abrange a vocação dupla de serviço da igreja, para ser ‘sal da terra’ e a ‘luz do mundo’.[1]

Aqui, a visão de “missão” de Stott não demonstra preocupação com a distinção entre o conceito no singular e plural. Sua preocupação maior é quanto ao conteúdo da missão. Por dupla vocação devemos entender o pensamento de Lausanne de que a evangelização e a responsabilidade social são dois braços da missão da Igreja.[2]

[1] Carriker, 4.
[2] Ver Lausanne, Evangelização e Responsabilidade Social, (São Paulo: ABU e Visão Mundial, 1983).

Missão tem a ver com atravessar fronteiras…

As fronteiras podem ser étnicas, culturais, geográficas, religiosas, ideológicas ou sociais.

É a tarefa da igreja em movimento, a igreja que vive para os outros, a igreja que está preocupada não somente consigo mesma, mas se vira ‘às avessas’ para o mundo[1]… Missão ocorre onde a igreja, no seu desenvolvimento total com o mundo e compreensividade de sua mensagem, dá testemunho por palavra e ação na forma de um servo, com referência à descrença, exploração, discriminação e violência, mas também com referência à salvação, cura, libertação, reconciliação e retidão…

Evangelização é mais que um mero segmento de missão… é antes, uma dimensão essencial de missão. É o âmago da missão cristã para o mundo…[2]

[1] Dietrich Bonhoeffer diz que “a igreja só é igreja quando o é para os de fora.”
[2] Carriker, 4-5.


A missão acontece entre a igreja, o evangelho e o mundo. Nesse sentido, somos convidados a repensar nossa visão tradicional que, sutilmente, pressupõe o evangelho como algo que a igreja tem e não como uma força que atua tanto na igreja como no mundo. Apesar da proclamação verbal do evangelho ser responsabilidade exclusiva da igreja, a ação poderosa que faz com que corações estejam preparados para o evangelho transcendem, em muito, a ação da igreja.

Exemplo disso podemos observar nos relatos de Atos 8, no encontro entre Filipe e o oficial etíope, e em Atos 10, no episódio envolvendo Pedro e Cornélio. Em ambos os casos, antes mesmo de Filipe e Pedro chegarem onde aqueles gentios se encontravam, o poder para salvação já trabalhava naquelas vidas. A proclamação verbal do evangelho foi precedida pela ação poderosa do Espírito Santo preparando aqueles corações para receberem a mensagem da salvação.


Assim sendo, em cada momento histórico e contexto cultural a Igreja deve avaliar-se não somente em relação ao mundo, mas também em relação ao Evangelho. Em certas situações a Igreja pode ter não somente se afastado do mundo, mas também do Evangelho. Em outros momentos, ela pode estar mais envolvida pelo mundo do que pelo Evangelho. Ou ainda, a igreja pode estar envolvida pelo evangelho em atitude de avanço na direção do mundo.

Desta forma, a prática da missão não é algo que tem o poder de transformar somente o mundo, mas também a igreja. Em Atos 10, tradicionalmente entendido como a conversão de Cornélio, parece-me que o primeiro a converter-se a ação de Deus foi Pedro. Assim também, quando a igreja passa a refletir sobre sua responsabilidade para com o mundo, pode vir a concluir que necessita, primeiramente, se render novamente ao evangelho.

domingo, 8 de março de 2009

Deseja que eu ande com ele


Ao entender um pouco sobre a luta das naturezas que existe dentro de nós, podemos ser tentados a pensar que Deus é injusto, de certa maneira, quando pede que sejamos perfeitos, como disse a Abraão (Gn 17.1). Ele sabe que nascemos com a natureza pecaminosa e que isso nos leva constantemente a errar. E não precisa de muito tempo na caminhada da vida cristã para percebermos que jamais conseguiremos ser perfeitos, no sentido de deixar de cometer erros.


Para entender esse assunto de perfeição é preciso analisar a vida de alguns homens que Deus considerou perfeitos. De Enoque, por exemplo, a Bíblia diz: “Andou Enoque com Deus e já não era, porque Deus o tomou para si” (Gn 5.24). Se Deus decide levar alguém para o Céu, deve ser porque esse alguém é perfeito, não acha? Mas qual foi o motivo por que Deus levou Enoque consigo? A Bíblia responde: “Ele andou com Deus”.

Analisemos o caso de Noé. As Escrituras afirmam que “Noé era homem justo e íntegro entre seus contemporâneos” (Gn 6.9). Não seria maravilhoso se um dia Deus dissesse de você: “Aqui está alguém justo e íntegro”. Não é isto que você gostaria de ser? Mas por que Noé foi considerado um homem justo e íntegro? A Bíblia responde: “Noé andava com Deus”.

E o que dizer de Davi? A Bíblia afirma que Davi foi um “homem segundo o coração de Deus”. Ah! Se um dia ele pudesse dizer isso de nós! O que mais poderíamos esperar? Mas, por que foi que Davi tornou-se o “homem segundo o coração de Deus”? Ele mesmo nos responde: “Andarei na presença do Senhor, na terra dos viventes” (Sl 116.9).

Voltemos ao caso de Abraão. Ele é chamado “O pai da fé”. Um dia Deus se apresentou a ele e disse-lhe: “Eu sou o Deus Todo Poderoso: Anda na minha presença, e sê perfeito” (Gn 17.1) Percebeu? Tudo que Deus esperava de Abraão era que andasse com Ele. O resultado disso, seria uma vida de perfeição.

Você percebeu que existe uma frase que é o denominador comum na vida de todos os homens mencionados? “ANDOU COM DEUS”. Todos eles foram perfeitos porque andaram com Deus. Existia um relacionamento maravilhoso de amor entre Deus e eles. Em sua experiência, tinham chegado ao ponto de não poderem viver separados de Deus. Por isso Deus os considerou perfeitos, santos, justos, íntegros e retos.

O interessante é que há sempre alguma coisa curiosa na vida de todos eles. Noé um dia ficou embriagado a tal ponto que tirou a roupa e ficou nu, dando um vexame para toda a família. Você já fez isso alguma vez? Noé fez e Deus diz que ele “era justo e íntegro entre seus contemporâneos”.


E o que dizer de Davi? Caiu fundo no pecado. Cometeu um adultério seguido de assassinato. Você já fez isso? Nunca? Davi fez e sabe o que a Bíblia fala sobre ele? Fala que Davi era “um homem segundo o coração de Deus”.

Abraão um dia foi tão covarde que teve medo de dizer que Sara era sua mulher e, afirmando que era sua irmã, quase empurrou Faraó ao adultério. Os resultados teriam sido terríveis se Deus naquela noite não tivesse agido em favor de Sara. Atitude covarde a de Abraão. Mas, sabem o que Deus diz dele? “Abraão era perfeito”. Paulo até o chama de o “Pai da fé”.

Há alguma coisa maravilhosa que Deus está querendo nos dizer através da experiência de todos esses homens. Algo grandioso que revolucionará nossa vida e nos mostrará um horizonte infinito de esperança.


Para os seres humanos, uma pessoa é perfeita, santa, justa, íntegra, quando nunca comete um erro, quando faz tudo certinho, quando cumpre todas as normas, leis e regulamentos. Todavia, para Deus, uma pessoa é perfeita quando se dispõe a andar com Ele. Quando faz do relacionamento com Cristo o mais importante da vida. Quando compreende tudo o que Cristo fez na cruz por ele e clama por um novo coração capaz de amar; quando sente dor por todo o sofrimento que causou a Cristo com seus erros passados, e ao olhar para a cruz se apaixona por Cristo ao ponto de dizer: Ó Senhor Jesus, eu te amo. Eu te amo tanto que sem ti a vida não tem sentido. Ajuda-me a andar contigo!

Naquele instante o maravilhoso Deus de amor derrama lágrimas de alegria e segura a fraca mão do homem com sua mão poderosa. E no instante daquele toque, nosso passado fica apagado para sempre, não importa se fomos bêbados ou covardes, adúlteros ou assassinos, tudo fica enterrado. Porque naquele momento, pelos méritos de Cristo, nos tornamos vitoriosos, com um caráter perfeito porque ele tomou sobre si os nossos pecados e a punição que merecemos.

A partir daquele momento começa a mais extraordinária e bela das experiências: a experiência maravilhosa de andar com Cristo. Naturalmente o amor é básico nesta experiência, porque não se pode conviver e ser feliz com uma pessoa a quem não se ama. A nossa tragédia às vezes consiste em que nós avaliamos a perfeição de acordo com nossa capacidade de obedecer aos princípios de uma Igreja ou mesmo da Bíblia. Deus avalia a nossa perfeição em razão do tipo de relacionamento que temos com ele.

Ao iniciarmos a nossa caminhada com Cristo descobriremos imediatamente que existem muitas coisas de que Cristo gosta e nós não gostamos. Existem também coisas das quais Cristo não gosta e nós gostamos. O que fazer numa circunstância semelhante? Estamos frente a um impasse. O que fazer? Aqui novamente entra o amor como solução para o problema.

Quando garoto, eu não gostava de quiabo. Era algo que não apresentava nenhum atrativo para mim. Um dia até experimentei comer, mas não gostei. Acontece que um dia conheci uma garota extraordinária que hoje é a minha esposa. Comecei a gostar dela e depois de um tempo de namoro nos casamos. Nunca esquecerei o primeiro almoço que ela preparou em casa. Ao chegar a cozinha achei a mesa arrumada e as panelas bem postas, cada uma com sua tampa. Ocupamos nossos lugares à mesa e depois de orarmos ela abriu as panelas. Uma das panelas era exatamente uma mistura de frango com quiabo. Cida estava com um brilho de expectativa nos olhos, como se perguntasse: “Será que ele vai gostar?”. Tomou meu prato e fez questão de servir uma boa porção de frango com quiabo. Olhei para o prato. Olhei para ela. Outra vez olhei para o prato. Tive vontade de dizer: “Obrigado querida, não gosto de quiabo”, mas não consegui. Eu a amava. Não tive coragem de desapontá-la. Peguei o garfo e praticamente engoli. No dia seguinte, ao sair da sala, fiquei paralisado. Lá no centro da mesa havia novamente uma panela com quiabo frito. Olhei para ela e afirmei: “Parece que você gosta muito de quiabo”. E ela, com a maior naturalidade do mundo, respondeu: “Quiabo é um dos meus pratos favorito querido”. Em fração de segundos imaginei minha vida toda engolindo quiabo. Mas ao olhar para o rosto dela e ver aquele sorriso de satisfação, senti uma alegria íntima no coração. Eu amo demais minha esposa. O que podia significar o fato de comer quiabo, comparado com a alegria de vê-la feliz? Hoje, um dos meus pratos preferidos é o frango com quiabo da Cida. Descobri que eu posso aprender a gostar de coisas que hoje não me são agradável.

Entende o que estou querendo dizer? O dia que nos apaixonarmos por Cristo, o dia que chegarmos a amá-lo com todo o nosso coração, a coisa que mais desejaremos ver é o sorriso em seu rosto. Sem dúvida haverá coisas que o deixarão feliz e que, nós, com a nossa natureza pecaminosa não gostamos de fazer. Não acredito que perder o gosto por coisas que estávamos acostumados a fazer ou aprender a fazer coisas que não gostávamos de realizar seja fácil. Haverá um preço que teremos que pagar e planos que teremos de esquecer. Muitas vezes isso exigirá esforço, sacrifício e sofrimento, mas tudo isso terá sentido, se o fizermos por amor à pessoa de Jesus.

O profeta Miquéias explicou um dia a maneira certa de andar com Deus. “Ele te declarou, ó homem, o que é bom; e o que o Senhor pede de ti, senão que pratiques a justiça e ames a misericórdia, e Andes humildemente com o teu Deus” (Mq 6.8). Você percebe que a questão não é simplesmente andar com Deus. O importante é andar “humildemente” com ele. É ele quem dirige e comanda a minha vida. Eu o amo e aceito seu conselho porque ele sabe o que é bom para mim. Não o conduzo a lugares que quero ir, ele é quem me dirige os passos. Ele é o meu Pai, meu amigo, meu Senhor. Eu apenas me abandono em seus braços de amor e vou.


Tudo isto tem sentido, unicamente quando existe amor. A vida toda é motivada pelo amor a Cristo. Se não existir um relacionamento de amor entre Cristo e nós a vida torna-se vazia, oca. O cristianismo vira um fardo, uma pesada carga de proibições e deveres. Podemos carregá-lo um ou 100 anos, mas, um dia chegamos ao limite e o largamos ou então nos tornamos zumbis, homens sem vida, máquinas que carregam o fardo, que cumprem tarefas, que obedecem, porém apenas máquinas, sem alegria, sem entusiasmo, incapaz de saber o que é felicidade.

Por aí, um dia, numa roda de amigos, alguém pergunta: “Por que você não bebe?” E quase com vergonha respondemos: “Porque minha religião não permite, é norma em minha Igreja”. A vida toda, às vezes, é levada desse jeito. É a religião, é a Igreja o que importa. E Cristo? Onde fica Cristo nisso tudo? O que será que ele está sentindo? Importa-nos se ele está sorrindo ou chorando? Você já pensou nele como uma pessoa que ama, que sorri, que tem sentimentos e até chora?

Vamos analisar a nossa compra de roupa, por exemplo. Você percorre as lojas, olha as vitrines, até que acha uma loja que lhe agrada. Como você faz para comprar essa roupa? Escolhe algumas peças e entra no provador. Experimenta uma a uma, olha no espelho, observa se fica bem em você e então ainda dentro do provador, olha para cima e pergunta: “Meu amado Jesus, qual destas peças te agrada? Quero que escolhas para mim porque eu o amo e me sentirei feliz usando as roupas que escolheres para mim”. E então, ao sentir que determinada roupa vá trazer uma expressão de tristeza no rosto de Cristo, você a dispensa. Sai dali apenas disposto a comparar aquelas peças que certamente irão agradar e honrar seu amado Senhor. Isso é andar com Deus.

Andar com Deus é tê-lo presente em nosso dia a dia. Consultá-lo antes de tomar uma decisão, antes de iniciar um namoro, antes de colocar uma tatuagem no corpo, antes de entrar em algum lugar, antes de sair para algum programa. Você vê? Nossa vida não se limita a atividades na Igreja. Não é uma religião que determina os nossos atos. Fazemos ou deixamos de fazer, comemos ou deixamos de comer, vestimos ou deixamos de vestir por amor a Cristo. Se vemos um sorriso em seu rosto, vamos em frente. Se, pelo contrário, percebemos um ar de tristeza em seu olhar é hora de parar, não porque a Igreja nos proíbe, mas porque o amamos e não temos coragem de vê-lo triste.


O Jesus que eu não conhecia não espera que eu nunca erre. Na verdade ele nunca escondeu que é impossível a nós nunca errarmos. Mas apesar disso, ele deseja caminhar conosco no dia a dia. Quando ele pede para que sejamos perfeitos, como pediu a Abraão, precisamos entender muito bem isso. Se você acha que ser perfeito significa nunca cometer um erro, não será isso possível. Mas graças a Deus que o conceito bíblico de perfeição é diferente. Para Deus, ser perfeito é “andar com ele”, como fez Enoque, Noé, Abraão e Davi.

Você já viu um pai levando o seu filho de quatro anos pela mão? Mesmo que o menino tropece, ele não cai ao chão porque as mãos seguras do Pai o sustenta. Foi por isso que estes homens foram perfeitos. Enoque segurou o braço do Pai e não temos notícias de que tenha caído alguma vez. Já os demais andaram com Deus, escorregaram, tropeçaram, mas seguraram o braço do Pai e não ficaram caídos; continuaram a caminhada. E Deus os considerou tão perfeitos quanto Enoque. A Bíblia diz que “O Senhor firma os passos do homem bom e no seu caminho se compraz. Se cair, não ficará prostrado porque o Senhor o segura pela mão” (Sl 66.25).

Você errou alguma vez em sua vida? Não precisa viver atormentado por isso. Olhe para a cruz de Cristo. Ele já pagou pelo seu erro. Ele lhe perdoa e o aceita. Você está ferido? A queda foi tão grande que não lhe resta mais forças? Não se preocupe. Apenas olhe. Olhe lá na montanha um Deus de amor morrendo lentamente. Por que você acha que ele sofreu tanto? Foi por amor a você. Foi porque você vale muito para ele. Um dia experimentei a revolta, o vazio e o desespero da alma e ele me amou e me perdoou e me aceitou. Por isso posso dizer que esse Jesus, eu não conhecia.

domingo, 1 de março de 2009

Defende seus amigos


Vimos na última pregação sobre este tema que dentro de nós existem duas naturezas lutando para obter o controle de nossa vida. O inimigo fará de tudo o que puder para que a natureza pecaminosa vença e nos empurre ao pecado. O alvo é a nossa mente porque ela significa a nossa vontade. O território de nossa mente é o campo de batalha. Se ele conquistar nossa mente, conquistou nossa vida. Por isso ele fará de tudo para capturá-la. Usará drogas, álcool, cigarro, sexo, teorias, filosofias. Não importa o método, não importa a hora, não importa o preço. O seu lema é vencer, derrotar e arruinar. Você descobrirá que a luta não é fácil, que há momentos em sua vida que você se sente como uma plantinha em meio do deserto tentando resistir a um furacão que o levará para a destruição.

O que fazer? Tem Deus alguma solução? Claro que tem. A Bíblia diz: “Não vos sobreveio tentação que não fosse humana; mas Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além das vossas forças; pelo contrário, juntamente com a tentação, vos proverá livramento, de sorte que a possais suportar.” (1 Coríntios 10.13)

Você vê. Deus nos dá forças para vencer as tentações. Mas a luta não cessará porque nosso inimigo é um inimigo invisível, astuto, covarde e persistente. Ele também é traiçoeiro. Nunca mostra o rosto. Ele se disfarça, se esconde e usa como instrumento para chegar ao controle da nossa vida algo muito sutil chamado tentação.



O que é tentação? É todo esforço que o inimigo faz para levar-nos a pecar. Mas tentação não é pecado. Ninguém precisa se sentir um pecador pelo fato de experimentar a tentação. Se você está deitado na cama e de súbito aparece um pensamento pecaminoso em sua mente, você não precisa pensar que está perdido e se condenar pelo fato de um pensamento negativo aparecer por um ou dois segundos. Lembre-se, você não pode impedir que um pássaro pouse sobre sua cabeça, mas pode impedi-lo que ele faça um ninho nela.

Existem muitos e variados tipos de tentações. Na realidade Satanás tem uma fábrica delas. Lá são elaboradas tentações personalizadas. Cada uma especialmente preparada para cada pessoa. E o inimigo conhece muito bem o lado fraco de cada ser humano. Para um será o álcool, para outro a deturpação do sexo. Enfim, a nossa luta é contra um ser inteligente. Ele conhece as nossas origens, o ambiente que crescemos, a herança que recebemos de nossos pais. Fará de tudo para nos enganar. Ele se esconderá atrás de uma música sensual, de uma mulher sedutora, de um rapaz maravilhoso, de uma teoria fascinante. Ele se vestirá de luz, se for preciso. Para os propósitos dele, vale tudo. O fim justifica os meios.

Mas tudo que ele fizer para enganar você é apenas tentação, e tentação não é pecado. O inimigo nunca poderá vencer a menos que conte com a sua colaboração. Ele pode fazer o que quiser. Pode rodear sua vida com diversas tentações, vozes, dinheiro, fama, prazer, luzes, o que quiser. Tudo não passará de tentações. Ele não pode obrigar-nos a pecar. Se cairmos é porque aceitamos cair. É porque cedemos voluntariamente aos feitiços da tentação. A tentação é como se fosse um telefone chamando. O pecado acontece se você atender. Se você não atender, não existe pecado. Mas o telefone continua chamando. Incomoda? Claro que incomoda, mas não passa de simples tentação.


Consideremos agora alguns conselhos que podem se úteis ao enfrentarmos a tentação. Quando a tentação vier, procure pensar em outra coisa. Já explicamos que a luta é para ocupar o território da mente, então coloque em sua mente promessas bíblicas. Há uma lei física que diz: “um espaço vazio só pode ser ocupado por um corpo ao mesmo tempo”. O espaço é a nossa mente. Toda vez que a tentação vier, peça socorro divino, repita um Salmo de cor, cante um hino, repita o verso da meditação daquele dia, coloque pensamentos e promessas bíblicas em sua mente. De acordo com a lei física, a tentação não terá vez.

O que não podemos é permitir que o pensamento negativo, chamado tentação, permaneça em nossa mente, permaneça em nossa mente mais de dois segundos. Não devemos acariciá-lo, não devemos deleitar-nos com ele, porque aí a tentação vira pecado. Primeiro em forma de desejo pecaminoso, que nos levará depois ao ato pecaminoso, e se repetido nos conduzirá ao vício.

Conta-se a história de um vendedor da Índia, que um dia chegou a uma pequena vila declarando que podia fabricar ouro. As pessoas correram para ver o estranho visitante. O homem colocou num prato grande um pouco de água, algumas gotas de tinta vermelha e começou a mexer o prato em círculos, repetindo algumas palavras mágicas. Num momento em que a atenção do público estava distraída, o vendedor deixou escorregar da manga um pedaço de ouro dentro do prato, e depois tirou a água da vasilha e mostrou a todos o pedaço de ouro. Todo mundo olhava perplexo. Um comerciante da cidade quis comprar a fórmula e o visitante prontamente vendeu. “Mas”, explicou, “você não pode pensar no macaco de rosto vermelho quando mexer o prato, porque se você pensar nele o ouro nunca aparecerá”. O comerciante prometeu que lembraria sempre do conselho, mas quanto mais se esforçava por esquecer tanto mais forte ficava em sua mente a imagem do macaco de rosto vermelho. E ele jamais conseguiu o desejado ouro.

Não lhe parece familiar este fato? Quanto mais queremos esquecer nossos erros, quando mais queremos jogar fora a tentação, ela está cada vez mais firme em nossa mente? Nesse momento o melhor é se lembrar do que disse o Salmista: “Guardo no coração as tuas palavras para não pecar contra ti” (Salmo 119.11).


E agora o conselho mais importante: Não olhe para você, olhe para Cristo. Isto é básico porque o resultado final dependerá de quem ocupa os nossos pensamentos. Olhar para nós só trará fracasso e frustração. Aí está a tragédia da humanidade. O mundo diz: “Olhe para você, descubra seu potencial, concentre-se para conseguir a força mental, descubra sua energia interna”. Mas dentro de nós só existe angústia, vazio, desequilíbrio e muitas vezes desespero. Deus tem um caminho melhor. Ele no pede que olhemos para Cristo. Este é um caminho simples, porém seguro.

Li sobre a experiência de um garoto chamado Alexandre.Ele devia ter seis ou sete anos de idade. Na escola todas as crianças tinham mais ou menos a idade dele. Só havia dois rapazes grandes, de 16 anos. Um deles era muito mau, batia nas crianças e tirava as coisas delas à força. A mãe de Alexandre costumava dar-lhe dois reais para o lanche. Dois reais dava para comprar um sorvete de morango e ainda restava troco para comprar amendoim torrado. O menino levantava todas as manhãs, com uma ansiedade tremenda de ir para a escola mais interessado no sorvete e no amendoim do que na própria aula.

Um dia, a caminho da escola, aquele rapaz mau saiu ao encontro de Alexandre e lhe pediu o dinheiro. O menino resistiu, mas o rapaz lhe dobrou o braço à força e tirou seu dinheiro. “Você está vendo aquele homem sem braço?” disse o rapaz ao menino enquanto apontava um homem maneta que morava no bairro. “Sabe por que ele não tem braço? Eu cortei o braço dele. E se você contar para sua mãe ou para a professora que tirei seu dinheiro, corto também o seu braço”.

Aí começou a tragédia de Alexandre. Dia após dia ele entregava seu dinheiro ao rapaz. Isso causava-lhe uma revolta muito grande. O pior de tudo era que não podia avisar ninguém. Não queria perder o braço. Tornou-se uma criança triste, chorava à noite sozinho. Não tinha mais motivação para ir à escola. Às vezes, na hora do recreio, aquele rapaz mau comprava um sorvete com o dinheiro de Alexandre e tomava perto dele, zombando e fazendo-o sofrer. O que podia fazer uma criança de seis anos contra um rapaz de dezesseis?

Certo dia, na hora do recreio, Alexandre estava olhando as crianças brincarem, quando aquele rapaz mau bateu numa delas. Naquele momento, apareceu o outro rapaz grande da escola e deu=lhe um murro. Para surpresa de Alexandre, o rapaz mau não teve coragem de enfrentá-lo. Uma idéia brilhou em sua mente. Procurou o outro rapaz e disse: “Você gostaria de ganhar 1 real todo dia?”. E contou-lhe a história toda. O rapaz prometeu lhe proteger. Combinaram que no dia seguinte ele esperaria Alexandre no lugar onde o rapaz mau o aguardava diariamente. Aquela noite quase não dormiu. “Amanhã”, pensava ele, “amanhã será meu grande dia. Nunca mais ninguém vai tirar o que é meu”.

No dia seguinte levantou-se cedo. Recebeu o dinheiro de sua mãe e se dirigiu à escola. Lá, no lugar de sempre estava o rapaz perverso o aguardando. Dessa vez Alexandre sequer olhou para ele. Seguiu o seu caminho, mas ele o alcançou e lhe pediu o dinheiro. “Nunca mais, ouviu? Nunca mais vou lhe dar o meu dinheiro”, disse Alexandre olhando com olhar desafiador para os olhos dele. O rapaz quase não podia acreditar o que estava ouvindo. Começou a dobrar o braço do menino. Mas naquele instante, do outro lado da rua saiu o outro rapaz e os dois deram uma surra no grandalhão. Você está rindo? Eu também. Mas tremo pensando nas horas de angústia e de impotência que uma criança de seis anos viveu.

Nós somos como Alexandre e o diabo é como aquele rapaz de dezesseis anos. Às vezes ele vem e nos tira, não a ilusão de um sorvete, mas a alegria da vida. Derruba nossos castelos, nossos sonhos, estraçalha nossos planos. Rouba-nos os valores morais, o respeito próprio, arranca de nós a paz e o equilíbrio interno e ri, ri porque se considera vitorioso. E sua gargalhada é como uma bofetada no rosto de Cristo. Às vezes brinca conosco, como gato e rato. Deixa-nos sair um pouco, deixa-nos pensar que estamos livres, para depois atacar com força, ferir, machucar e humilhar. E aí perguntamos: Por quê? Por que tem que ser assim?

Do outro lado da rua, lá na montanha solitária foi pendurado um Deus-homem não só para dar perdão, mas também para dar poder. Quando ele morreu, o inimigo pensou que tinha vencido, mas ao terceiro dia, ressurgiu como vitorioso. Ressuscitou. Hoje vive. Vive para dar poder. Olhe para o túmulo vazio. Olhe para o céu e veja o gigante da história disposto a vencer em seu favor. Cristo venceu! Venceu seu inimigo no deserto. Venceu-o na cruz. Venceu-o na morte. É capaz de vencê-lo em nosso favor quantas vezes forem necessárias.