quinta-feira, 2 de abril de 2009

Vida e obra de Jesus: Modelo para a Igreja


A intenção de Jesus era que sua vida e obra se tornasse modelo para compreensão da igreja sobre o seu papel no mundo. Desta forma, gostaria de sugerir três características básicas do ministério de Jesus, as quais devem moldar a vida e a missão da comunidade que se diz enviada ao mundo por Ele.



No princípio do evangelho de João encontramos uma das mais impressionantes declarações de toda a Bíblia: “o Verbo se tornou carne e habitou entre nós”. (Jo 1.14). Em outras palavras, o Deus missionário se tornou um dentre nós (Mt 1.22-23).

Deus se fez homem, nasceu numa pequena vila chamada Belém, foi criado dentro dos valores culturais judaicos por uma família de Nazaré, mais tarde andou pelas ruas empoeiradas das vilas e povoados da Palestina, esteve cercado por pessoas dos mais variados tipos, encontrou espaço para ouvi-los, participou de suas festividades populares e religiosas e compartilhou de suas dores e sofrimentos. O Deus encarnado estava sempre lá, se envolvendo com a história daqueles que o cercavam. Por não evitar as pessoas, as situações e os lugares, Ele sabia como anunciar sua mensagem e como agir de forma que suas palavras e suas ações fizessem sentido aos corações de seus contemporâneos.

O texto de Fp 2.5-8 desafia a igreja a pensar na encarnação de Jesus como um modelo a ser imitado. Através de sua encarnação, Jesus renuncia seu status de “ser igual a Deus”. Como conseqüência direta desta renúncia, Jesus abre mão de sua imunidade expondo-se a tentações, limitações físicas, desgastes emocionais, dificuldades financeiras, decepções, dores, entre outras coisas. Renunciando a estas coisas Jesus escolheu ser entre nós aquele que serve e não o que é servido (Lc 22.27). Ele decidiu identificar-se com homens e mulheres em suas necessidades visando oferecer-lhes o caminho divino. Encarnação fala de aproximação do mundo e das pessoas, do seu cheiro e de seu gosto, de sua dor e de seu sofrimento. Foi este o modelo deixado por Jesus para nós como igreja. Ele não sobrevoou o mundo dos homens, ele viveu entre nós. Ele não sentiu o cheiro deste mundo, ele teve este cheiro. Ele não presenciou nossa dor, ele a sentiu (e como sentiu!).

Sei que tal proximidade e identificação da igreja com os homens e mulheres gera em muitos certa preocupação. O medo destes é de que ao aproximar-se do mundo dos homens e mulheres que lhe cercam, a igreja acabe por perder sua própria identidade. É bom lembrarmos que Jesus, em sua tarefa, envolveu-se com os pecadores, não com seu pecado. A igreja, em sua história, muitas vezes participou dos pecados dos pecadores (orgulho, egoísmo, cobiça), afastando-se, porém, dos pecadores. Assim como Cristo aproximou-se de nós, tomando nossa forma, a fim de nos reconciliar com o Pai, nós como igreja devemos nos aproximar do mundo que nos cerca, identificando-nos com os homens e mulheres que nele vivem, com o propósito de fazermos diferença em suas vidas.



De acordo com o evangelista Marcos, Jesus inicia seu ministério afirmando: “O tempo está cumprido e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho” (Mc 1.15). Desta forma, a proclamação verbal do reino torna-se uma marca essencial e um valor inegociável na missão de Jesus. Desde o início de seu ministério encontramos a afirmação “Daí por diante passou Jesus a pregar…” (Mt 4.17). Mais tarde, ele envia seus discípulos ordenando “pregai que está próximo o reino dos céus” (Mt 10.7).

Por um lado, o anúncio verbal do reino de Deus é feito como boas novas. Jesus descreve o reino como um tesouro de valor inestimável diante do qual tudo o que um homem possui se torna dispensável (Mt 13.44). Por outro lado, o anúncio verbal do reino em Jesus está associado à ênfase de que aqueles que abraçam estas boas novas não estão somente debaixo dos benefícios do reino, mas também debaixo do chamado para o arrependimento e para a obediência. Isto implica na reorientação completa da vida à luz das prioridades e valores do reino. De acordo com Jesus, se alguém quer segui-lo “a si mesmo se negue, dia a dia tome a sua cruz” (Lc 9.23).

Como Igreja precisamos nos posicionar com humildade diante das injustiças, mentiras e cultura pecaminosa de nossos dias sem, contudo, nos esquecer de apresentar sinais do reino em nosso estilo de vida. Se em Romanos 14.17 encontramos que o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo, onde estão os cristãos engajados na luta pela justiça em nossa cidade? Onde estão os cristãos defensores e mobilizadores da paz em nossos bairros violentos? Onde estão os cristãos promotores de uma alegria real na vida das tão sofridas famílias de nossas ruas?

Como Igreja precisamos renovar nosso compromisso com o anúncio verbal do Reino e com a manifestação do Reino em toda sua inteireza, a fim de que o crescimento do Reino em nossa cidade seja percebido não só nas estatísticas do IBGE, mas na vida daqueles que se dizem cidadãos do Reino e das Igrejas que chamam Jesus por Senhor, nas mais diferentes esferas e frentes de nossa sociedade.


De acordo com os relatos do Novo Testamento, a missão de Jesus sempre se encontra intimamente relacionada à presença e ação do Espírito Santo de Deus. Foi pelo Espírito Santo que Jesus: 1) foi concebido (Mt 1.18); 2) foi confirmado como filho de Deus (Mt 3.16-17); 3) foi guiado para o deserto para ser tentado (Mt 4.1); 4) revelou os segredos do reino (Mt 16.17) e 5) foi levantado dentre os mortos (Rm 8.11). Portanto, não podemos falar acerca da missão de Jesus sem falar da presença e do ministério do Espírito Santo.

Em suas últimas palavras (At 1.8) Jesus promete o Espírito que haveria de capacitar e impulsionar a Igreja no exercício da missão. Foi sob a ação do Espírito que: 1) os discípulos anunciaram o evangelho em Jerusalém (At 2.4,14); 2) em Samaria (At 8.5,14-17); 3) Felipe deixou Samaria para evangelizar no deserto (At 8); 4) Pedro foi ao encontro de Cornélio (At 10); Paulo e Barnabé foram separados e enviados na primeira missão oficial entre os gentios (At 13.1,2). As viagens missionárias foram conduzidas (At 16.7).

Com base nessa verdade precisamos reconhecer que a missão, muito antes de tarefa da igreja, é obra de nosso próprio Deus no mundo. Parece-me então que a confiança no Espírito Santo como capacitador e articulador da missão deve nos levar como Igreja a um constante espírito de humildade e questionamento interior: A motivação final das atividades que realizamos é a missão de Deus? Diante dos projetos para crescimento da Igreja temos nos deixado tomar pelo excesso de confiança em nós mesmos? Em meio a muitas atividades, perdemos de vista o fato de que a obra não é nossa, mas de Deus? Nossa eficiência demonstrada em números é sempre sinônimo de fidelidade à voz do Espírito?

O desafio aqui lançado não pode ser confundido com um simples “não ter programas”, “não ter estratégias”, ou mesmo “não estabelecer metas”. Muito pelo contrário. Vemos o apóstolo Paulo planejando sua ação missionária com destino a Roma e estabelecendo igrejas de forma estratégica no mundo de então. No entanto, o perigo está em confundirmos os mecanismos de análise de eficiência das técnicas e estratégias gerenciais com a avaliação de fidelidade diante da missão dada por Deus.

No ministério de Jesus, muitas vezes diante de multidões, o Espírito direciona a atenção de Jesus a um marginalizado à beira do caminho com o qual os líderes das massas não queriam qualquer associação pelos prejuízos com a imagem (João 9). No desenvolvimento da igreja em Atos dos Apóstolos, o mesmo Espírito que direciona os esforços dos discípulos para Samaria e faz ali uma tremenda obra, numericamente falando, conduz Filipe para um lugar deserto para evangelizar um só homem. Assim, a lógica do Espírito não é a mesma dos programas e estratégias gerenciais que usam como critério de medição a “eficiência”. O Espírito trata-nos a partir da “fidelidade”.

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