Fico assustado com o número de templos religiosos que existem num raio de 1,5km de minha casa. A impressão que eu tenho é de que igreja se tornou de fato um pequeno grande negócio. A luta da maioria destas igrejas não é por alcançar perdidos com a verdade do Evangelho, mas é de lotar seus assentos e naturalmente ter uma arrecadação financeira de matar de inveja muitas outras. Ainda hoje, quando me dirigia ao culto, ao passar em frente de uma dessas igrejas, ouvi em bom e alto som alguém dizendo: “Já estou sentindo o cheiro de sua vitória!” e aí sorri discretamente enquanto pensava: “Enquanto esse rapaz sente o cheiro da vitória, estou indo falar sobre sofrimento. Meu ‘menu’ não está nada agradável né?”
Infelizmente essa é a nossa realidade. Estamos muito mais preocupados em falar palavras extremamente otimistas que em determinados momentos temos uma forte convicção de que cristão não pode sofrer. Como filhos de Deus não podemos admitir isso. No entanto, quando olho para a Bíblia encontro outra realidade. Dos 150 Salmos, mais de 60 são de lamento, o que acaba colocando em xeque a idéia de vitória sempre. É certo que muitos acabam optando sempre pelos extremos. Ou a vida cristã é só de vitória ou o sofrimento é uma demonstração de sacrifício agradável a Deus. Não encontro base bíblica para nenhuma dessas posições.
Uma coisa é certa, todos estamos sujeitos ao sofrimento. Quer queiramos ou não. Um dia ele entra na sala de nossa vida sem pedir licença e leva-nos a um período que pode não ter o fim que gostaríamos. Todavia, quando o sofrimento nos alcança, o que podemos fazer para enfrentá-lo? Existe alguma orientação bíblica sobre isso? Certamente.
Durante o sofrimento precisamos aprender a processar a dor e isso deve ser feito através da prática do lamento. Lamentar significa expor a nossa dor, chorar em prantos, contar a nossa versão do sofrimento para Deus, o mesmo que desabafar, sempre com respeito, é claro.
Infelizmente adotamos uma cultura desumana que ensina que o choro é sinal de fraqueza. Dessa forma aprendemos a sermos pessoas que não demonstram os sentimentos. Ainda aprendemos com Santo Agostinho que qualquer manifestação física ou emocional deve ser reprimida porque tudo o que vem do corpo é pecado. E a Igreja passou anos acreditando nisso. Diante de ensinos como esse, acabamos por não dar espaço para o processamento da dor em nossa comunidade e vida.
A Bíblia, no entanto, está cheia de exemplos de lamento. Jó rasgou suas roupas, vestiu-se de pano de saco e assentou-se em cinzas quando a tragédia invadiu a sua família. Maria Madalena chorou em prantos quando viu o sepulcro vazio e deduziu que alguém havia roubado o corpo de Jesus. Jeremias é chamado de o profeta chorão. O livro de Lamentações é atribuído a ele. Escreveu seu lamento quando Judá foi levado cativo à Babilônia. Veja o que ele disse em seu lamento:
“Eu sou o homem que viu a aflição trazida pela vara de Deus. Ele me impeliu e me fez andar na escuridão, e não na luz; sim, ele voltou sua mão contra mim vez após vez, o tempo todo. Fez que a minha pele e a minha carne envelhecessem e quebrou os meus ossos. Ele me sitiou e me cercou de amargura e de pesar. Fez-me habitar na escuridão como os que há muito morreram. Cercou-me de muros, e não posso escapar; atou-me a pesadas correntes. Mesmo quando chamo ou grito por socorro, ele rejeita a minha oração. Ele impediu o meu caminho com blocos de pedra; e fez tortuosas as minhas sendas. Como um urso à espreita, como um leão escondido, arrancou-me do caminho e despedaçou-me, deixando-me abandonado. Preparou o seu arco e me fez alvo de suas flechas. Atingiu o meu coração com flechas de sua aljava. Tornei-me motivo de riso de todo o meu povo; nas suas canções eles zombam de mim o tempo todo. Fez-me comer ervas amargas e fartou-me de fel. Quebrou os meus dentes com pedras; e pisoteou-me no pó. Tirou-me a paz; esqueci-me do que significa prosperidade. Por isso digo: "Meu esplendor já se foi, bem como tudo o que eu esperava do Senhor". Lembro-me da minha aflição e do meu delírio, da minha amargura e do meu pesar. Lembro-me bem disso tudo, e a minha alma desfalece dentro de mim.” Lamentações 3.1-20
Observe que Jeremias dá sua versão para a sua dor. Ao expor o que estava pensando ele faz o seu desabafo. Deus em nenhum momento o reprime, pelo contrário, ele entende o coração humano. Ele dirige palavras duras até contra Deus, e somente assim, chorando e falando com Deus é que ele consegue perceber a causa de tudo aquilo e qual a saída para aquela situação.
Melhor do que chorar, prantear e fugir da presença do Senhor, como fez Jonas, é fazer tudo isso aos pés do Senhor. Quando fizermos isso, Deus nos ouvirá, sem repressões, sem acusações, compreenderá nosso lamento e cuidará de nossa dor. Deus é o nosso amigo, para quem podemos correr e contar tudo, absolutamente tudo.
Existem pelo menos três causas de sofrimento. Por causas naturais (envelhecimento, doenças genéticas, etc...); Por provação divina (Caso de Jó) e por pecados cometidos por nós ou por alguém ligado a nós. Enquanto chora, soluça e escreve, Jeremias é levado a compreender que, em seu caso específico, o sofrimento que tanto ele como o seu povo estavam passando tinha como causa os seus próprios pecados. O povo de Jeremias lamentou-se diante de Deus dizendo:
"O Senhor é justo, mas eu me rebelei contra a sua ordem. Ouçam, todos os povos; olhem para o meu sofrimento. Meus jovens e minhas moças foram para o exílio. Chamei os meus aliados, mas eles me traíram. Meus sacerdotes e meus líderes pereceram na cidade, enquanto procuravam comida para poderem sobreviver. Veja, Senhor, como estou angustiada! Estou atormentada no íntimo, e no meu coração me perturbo pois tenho sido muito rebelde. Lá fora, a espada a todos consome; dentro impera a morte. Os meus lamentos têm sido ouvidos, mas não há ninguém que me console. Todos os meus inimigos sabem da minha agonia; eles se alegram com o que fizeste. Quem dera trouxesses o dia que anunciaste para que eles ficassem como eu. Que toda a maldade deles seja conhecida diante de ti; faze com eles o que fizeste comigo por causa de todos os meus pecados. Os meus gemidos são muitos e o meu coração desfalece." Lamentações 1.18-22. Já no capítulo 3.39-40, Jeremias escreve a sua queixa dizendo: “Como pode um homem reclamar quando é punido por seus pecados? Examinemos e submetamos à prova os nossos caminhos, e depois voltemos ao Senhor.”
Em tudo isso parece haver uma contradição. O lamento, a queixa, a reclamação feita a Deus por muitas vezes deveria ser feita a mim mesmo? E em sendo assim, não é errado então eu reclamar à Deus? Não. Enquanto lamentamos diante de Deus, ele nos mostrará nossos erros se o tivermos cometido. Daí, eu e você poderemos aprender com os nossos erros. Por vezes até desejosos de acertar, acabamos por optar por situações que certamente nos causará muita dor. No lamento sou lembrado de que não vale a pena desviar dos princípios seguros da vida cristã estabelecidos por Deus carinhosamente para minha felicidade. Por isso, não fixe os olhos apenas na dor, mas procure identificar a causa dela. Admita seus erros quando identificá-los e arrependa-se. Mas o que fazer quando a causa de meu sofrimento for causas naturais ou provações? Em todos os casos você precisará fazer algo mais com o seu lamento – renovar sua esperança no Senhor.
Enquanto Jeremias chorava a situação de seu povo e a sua dor, ele percebeu que a sua memória só trazia coisas negativas e ruins para pensar. Quanto mais lamentava a situação, parecia que pior ficava. A Bíblia diz-nos que um abismo chama outro abismo, e quando estamos passando pelo sofrimento, isso se torna uma verdade incontestada.
Lamentar por lamentar pode ser perigoso. É preciso passar por todo o processo – Contar a Deus a nossa versão, aprender com os nossos erros e nunca esquecer do último passo que é renovar a esperança na intervenção e cuidado divino. Jeremias fez isso. No capítulo 3.21-31 ele diz: “Quero trazer à memória o que me pode dar esperança. Graças ao grande amor do Senhor é que não somos consumidos, pois as suas misericórdias são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a tua fidelidade! Digo a mim mesmo: A minha porção é o Senhor; portanto, nele porei a minha esperança. O Senhor é bom para com aqueles cuja esperança está nele, para com aqueles que o buscam; é bom esperar tranqüilo pela salvação do Senhor. É bom que o homem suporte o jugo enquanto é jovem. Leve-o sozinho e em silêncio, porque o Senhor o pôs sobre ele. Ponha o seu rosto no pó; talvez ainda haja esperança. Ofereça o rosto a quem o quer ferir, e engula a desonra. Porque o Senhor não o desprezará para sempre. Embora ele traga tristeza, mostrará compaixão, tão grande é o seu amor infalível.”
Lembrar de quantas vezes Deus esteve cuidando de você em outras situações fortalecerá a sua esperança. Jeremias percebeu que mesmo em meio ao sofrimento, o cuidado de Deus pode ser visto. Durante todo o tempo do cativeiro Deus não deixou de enviar os seus profetas. A palavra amiga, o pão dividido, o choro sincero de um parente, a mão estendida, certamente são manifestações desse cuidado divino para com a sua vida quando chega o sofrimento. Todavia, nada melhor do que recordar o cuidado de Deus em tempos passados para ter a esperança renovada.
George Muller, um grande homem de Deus, tinha o costume de anotar suas orações num caderno. Quando ele passava por um momento difícil, recorria ao seu caderno e assim ele se trazia à memória que Deus nunca o abandonara. Dessa forma sua esperança era renovada em meio ao sofrimento e a dificuldade. Ao morrer, o caderno deste grande homem já contava com mais de cinco mil orações respondidas. O sofrimento tem o poder de apagar de nossa memória as muitas vezes em que Deus agiu a nosso favor. Manter um caderno com registro de nossas orações nos ajudará a ter sempre diante dos olhos a verdade dita por Jeremias: “as suas misericórdias são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a tua fidelidade!”.
Ainda que, por um motivo que foge da nossa compreensão, o sofrimento nos acompanhar até o fim de nossos dias, lembre-se que ele está com seus dias contados. A Palavra de Deus nos garante que Deus tem preparado para seus filhos uma vida completamente isenta de dor, sofrimento, necessidades e morte. Essa nova vida será uma realidade na eternidade. Quando encontrarmos com o Senhor na eternidade a Bíblia diz que “O Soberano Senhor enxugará as lágrimas de todo o rosto e retirará de toda a terra a zombaria do seu povo. Foi o Senhor quem disse!” Isaías 25.8.
Você já se comprometeu com Cristo assegurando assim a vida eterna? Como pecadores, não temos condições para livrarmos do sofrimento eterno. Exatamente por isso Cristo pagou a dívida de nossos pecados e oferece essa vida sem sofrimento para todos aqueles que se aproximarem dele, confessando sua incapacidade e comprometendo-se com ele, fazendo uma aliança de viver com ele e para ele todos os dias. Tomara que você aceite essa proposta.